Você também pára pra olhar sua vida e não consegue acreditar em tudo que aconteceu, como se você não soubesse como chegou até aqui? Um dia acorda e vê que tantos marcos que esperou com muita ansiedade de repente passaram e é como se você não tivesse se dado conta?

Eu tenho uma sensação constante de que meu mundo interior não consegue se atualizar dos acontecimentos com a rapidez necessária. Há um descompasso entre o ritmo da vida, seguindo sempre em frente, implacável, e o meu ritmo. A velocidade em que eu seria capaz de absorver as coisas.

O problema não é no campo da ação; aprendi a me movimentar e me adaptar com rapidez e tudo parece funcionar em uma sinfonia louca. Mas conseguir estar presente para tudo que está acontecendo e ter espaço pra processar? Aí fica mais difícil.

Percebo a mesma sensação de estar no meio de um turbilhão em muitos clientes e amigos. O coaching na verdade acaba sendo um espaço para se dar conta de como você chegou até aqui e poder respirar um pouco e enxergar a paisagem à sua volta. De parar no meio do furacão e entender onde você aterrissou.

Mas cada vez mais vejo que não dá pra ignorar a questão da velocidade que a vida tomou nos últimos tempos. É tudo muito rápido, instantâneo, conectado, mudando constantemente. A gente se adapta a isso e sai correndo pra cuidar de tudo, mas algo se perde no meio do caminho. O que acontece com o nosso ritmo orgânico, com o ritmo do corpo, com o jeito cíclico da nossa natureza, que precisa também dos invernos e dos dias chuvosos, entocados?

Acho que só percebemos o ritmo frenético quando ele é quebrado forçosamente. Para mim ele foi quebrado por uma semana porque minha gatinha foi castrada e eu precisei ficar de olho nela durante a recuperação. Achei que ia aproveitar pra trabalhar nesse tempo, mas vigiar gato é uma tarefa muito mais intensa do que eu imaginava.

Não lembro quando foi a última vez que passei um tempo assim realmente sem fazer nada. O espaço interno que se abre é absurdo. Parece que tinha uma fila de pensamentos, impressões, ideias, só esperando uma brechinha para sair. Lembrei de coisas que tinha esquecido há anos. Um espaço que me lembrou a adolescência, quando o tempo era abundante e saber o que fazer com ele parecia um problema. Hoje esse ócio me caiu como uma benção sem tamanho, um luxo enorme.

Me volta a ideia de que é preciso dar um espaço consciente na nossa agenda lotada para o nada, para o total relaxamento, para poder soltar tudo por um momento. Para realinhar com nosso ritmo orgânico e dar um tempinho para corpo e a mente descansarem.

O problema é que hoje em dia queremos cuidar de tudo: mente, corpo, espírito, emoções, relacionamentos. E na verdade acho isso incrível, mas acabamos com uma lista infinita de coisas a fazer. Exercícios, comer bem, meditar, dormir, ter tempo para as pessoas importantes, ler, estudar, dar aquela dedicação extra ao trabalho… Com tanto para ser feito, vivemos como Sísifo empurrando eternamente a pedra morro acima para assisti-la rolar de volta dia após dia. Hoje você pode até ter conseguido cumprir sua lista gigantesca, mas amanhã sempre tem mais.

Claro que isso é um jeito de ser e tem gente que leva tudo na maior leveza, que se permite, que não se importa em atingir tantos padrões. Mas vejo muitos de nós nesse malabarismo constante e sei o quanto isso é pesado. Então, para quem também se estica ao máximo: como podemos sair dessa roda de hamster? Dar um passo pro lado e poder viver, pelo menos por alguns momentos, em um ritmo mais lento, permissivo, expansivo?

Parece simples demais e ao mesmo tempo impossível, mas e se pudermos separar um tempo para desacelerar? Um espaço para fazer coisas simples que não levem a lugar nenhum? Ler um livro só por prazer, ir caminhar no seu ritmo sem precisar queimar nenhuma caloria. Ouvir música sem fazer nada ao mesmo tempo. Cozinhar algo que você tem vontade só porque é gostoso. E acostumar a ouvir essas vozes na sua mente que gritam que você está perdendo tempo, deveria estar sendo produtivo, ou “se cuidando” da maneira certa, irem diminuindo até que sumam.

E de repente você se vê respirando mais profundo. Movendo-se mais devagar. Mais sereno, contente. E quem sabe assim a gente reaprenda a ouvir nosso ritmo interno. Saber quando é tempo de hibernar um pouco. Quando é tempo para o silêncio. Aprendendo a ouvir o compasso da nossa natureza e como ele pode ser respeitado no mundo dos algoritmos, dos 140 caracteres, dos 60 segundos.